quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Diários não expurgados: Silêncios de mármore

 
Sebastião Salgado - Refugiados da Etiópia

Eu observava confusa seu modo descontraído ao acender os cigarros, a prataria enferrujada na estante, pensamentos e vociferações despidas de quase, sua fúria gratuita tombada sobre a minha sombra, seus passos barrando os meus porquês... E nós sabíamos, embora não ousássemos, que eu deveria partir. Partir sem acender as luzes, sem borrar os olhos, sem fazer estardalhaço. Partir sem apagar as velas, sem levar tudo que me era justo, entretanto, partir sem esquecer rastros.

“Mas se eu tivesse ficado, teria sido diferente? Melhor interromper o processo em meio: quando se conhece o fim, quando se sabe que doerá muito mais — por que ir em frente? Não há sentido: melhor escapar deixando uma lembrança qualquer, lenço esquecido numa gaveta, camisa jogada na cadeira, uma fotografia — qualquer coisa que depois de muito tempo a gente possa olhar e sorrir, mesmo sem saber por quê. Melhor do que não sobrar nada, e que esse nada seja áspero como um tempo perdido.” Caio Fernando Abreu

“Amar a nossa falta mesma de amor, e na secura nossa amar a água implícita, e o beijo tácito, e a sede infinita.” Drummond 

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