sábado, 26 de fevereiro de 2011

O Inferno, Igmar e eu


Imagem de Cenas de um Casamento (1974) de Bergman

Magoamo-nos um ao outro sem sentido e as farpas permanecerão quando formos para a cama. É como estar deitada numa cama de pregos. (Marianne)

Tarde de julho em algum canto de 2008. Encontrei o exemplar escrito de Cenas de um Casamento num sebo amarelo da São Sebastião. Ir ter com Bergman sempre foi um ato de coragem, talvez por ser o diretor com quem eu mais me corresponda emocionalmente: incomunicabilidade, morte, culpa. Personagens deprimidos se contorcendo em cenários nebulosos que os hostilizam. Alguns meses depois eu disse sim. No drama em questão o diretor sueco aborda os (des)caminhos das experiências conjugais,  o amor é reconstituído de maneira trágica à medida que assistimos a desintegração psicológica das personagens, furtando a esperança de qualquer anseio romântico numa relação a dois. Há a construção de tipos emocionalmente leigos, destituídos de auto conhecimento embora esclarecidos intelectualmente.  Um soco na boca do estomago daqueles que acreditam que se não falamos sobre determinada coisa ela não existe.

O casal de que trata o drama personifica os atributos não interrogados de uma vida pequeno burguesa, onde não se vislumbra nada além de segurança material. A ilusão de que se trata de um casamento perfeito é de imediato esfacelada pela similaridade que alguns traços guardam com o inferno – palavra que mais se repete ao longo do texto.
Em face à primeira adversidade emerge uma ferida não cicatrizada, no entanto, ao menor sinal de que algo não está bem, as desventuras são entulhadas fora do alcance dos olhos. A arte de varrer para baixo do tapete se mostra insatisfatória quando o marido se apaixona por outra e movido pela ânsia vital é tomado pela brutalidade e pelo egoísmo eufórico. Desamparada, Marianne sucumbe. Mas o tempo se arrasta e à medida que a jovem se recupera, John se aproxima cada vez mais do inferno. Passam a protagonizar então um processo gradual de desumanização, onde destilam a aversão mútua e contida, com o intuito de se destruírem. E conseguem. Renasce algo novo desse aniquilamento, uma espécie de realfabetização de si mesmos, embora ainda haja desorientação e relações atarracadas. A diferença é que agora vivem num mundo de verdades e realidades escancaradas. Mas não há final feliz.

Interlúdio:





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